calendar, eyeglasses, plan-2559708.jpg

Inovação Aberta todo Dia

Claudio Cardoso | Alfa Collab | novembro 2021

There is real magic in enthusiasm. It spells the difference between mediocrity and accomplishment.

Norman Vincent Peale

Qualquer um que esteja enfrentando com seriedade o desafio de perder peso e depois de atingir a meta continuar mantendo o novo patamar, sabe o quão difícil é mudar os hábitos alimentares. Não é diferente quando o assunto é a busca por mais eficiência e maior competitividade por meio da inovação. Os dois movimentos, perder peso e ganhar em competitividade com inovações têm ainda mais um elemento em comum, além da imensa dificuldade em modificar comportamentos ineficientes: são, ambos, uma questão de sobrevivência.

A esta altura parece haver certo consenso de que a alta direção é, em geral, uma aliada e não um obstáculo para a assimilação da cultura da inovação. Mesmo porque, se assim não for, os programas de inovação nem chegam a começar. O fato é que existe uma barreira interna natural para a assimilação dos novos hábitos e umas delas é, certamente, a própria rotina produtiva.

Nesta perspectiva, duas camadas são as mais envolvidas: a média gerência e os seus liderados, isto é, justamente aqueles que colocam de pé a operação. Em regra, esses funcionários – média gerência e seus times – são pressionados por metas já bem estabelecidas, que não incluem os imponderáveis resultados obtidos pela inovação.

Por outro lado, é da natureza da inovação a experimentação, o erro, o risco no investimento, e a precariedade dos empreendimentos que apenas engatinham. Em grande medida, o avesso dos processos bem estruturados e já bastante otimizados das organizações mais experientes. Justamente aquelas que podem sofrer impactos devastadores das inovações disruptivas, essas cada vez mais comuns.

Ou seja, em geral, a alta direção está plenamente ciente de que seus negócios podem desaparecer em poucos anos caso não produzam ou incorporem inovações que as tornem mais competitivas. Mas o modelo de operação de suas empresas cria obstáculos para que as pessoas que realmente farão a diferença em ganhos de eficiência e na implementação de mudanças profundas, às vezes, dolorosas, sejam capazes de assimilar mentalidades inovadoras no cotidiano.

Difusão da inovação e seus desafios

Diante de um cenário em que são cada vez mais recorrentes os casos de disrupções de mercados, que levam ao desaparecimento algumas das maiores organizações, a ambidestria, isto é, a capacidade de tocar simultaneamente as operações convencionais e investir seriamente em inovações, tornou-se qualidade vital para competir e sobreviver (O’REILLY III e TUSHMAN, 2004). Deste modo, a cultura organizacional pode promover ou impedir a ambidestria e suas disciplinas fundamentais subjacentes, tais como as práticas de ideação, co-criação, incubação, mentalidades de negócios exponenciais e de growth.

Curiosamente, a dificuldade de assimilação da cultura da inovação pelo público interno das organizações não difere muito do considerável esforço que a sociedade em geral envida para adotar inovações. Em seu célebre livro Diffusion of Innovations, lançado em 1962, Everett Rogers propõe quatro elementos principais de influência para que uma nova ideia seja assimilada: a qualidade da própria inovação, os canais de comunicação, o tempo e o sistema social. Todo o processo de difusão, segundo o autor, repousa sobre o capital humano: é ele quem determina o sucesso ou o fracasso da adoção das inovações, acima da própria inovação e dos seus benefícios.

Sua teoria busca explicar como, porque, e a que ritmo uma inovação é difundida e adotada nas mais diversas culturas. No livro, o autor argumenta que a difusão é o processo pelo qual as inovações são comunicadas por meio de certos canais, ao longo do tempo em um determinado sistema social. Esses argumentos, hoje amplamente aceitos, causaram estranheza à época do lançamento, uma vez que apontava para aspectos considerados irracionais na adoção de vantagens. Em muitas ocasiões, como Rogers pôde perceber de forma conclusiva em suas pesquisas em comunidades da América do Sul, ocorre uma recusa sistemática da incorporação de medidas claramente vantajosas.

Rogers (1962) identificou cinco aspectos que concorrem de forma importante para o sucesso ou o fracasso da difusão de inovações:

  1. A adoção de inovações não resulta apenas dos seus benefícios imediatos;
  2. Existe uma correlação direta entre a assimilação das inovações e quem as endereça. O prestígio do porta-voz conta muito, às vezes de forma decisiva;
  3. A adoção da inovação depende da capacidade de interpretação e do repertório intelectual para quem ela é endereçada;
  4. Também depende dos sistemas sociais de aprovação e de reconhecimento positivo dirigidos a quem a adota;
  5. Por fim, indivíduos e instituições realizam um balanço intuitivo entre custos e benefícios para a adoção.

Várias empresas de grande porte não conseguem abraçar a cultura da inovação, não por falta de recursos, mas porque seus processos bem assimilados e valores estabelecidos atrapalham o desenvolvimento de novas oportunidades que visam pequenos ganhos iniciais, com margens que podem ser consideradas irrelevantes.

Novos negócios, quando apenas nascem, costumam se apresentar de forma confusa e com aparência nem sempre tão atrativa. Inovações disruptivas costumam contradizer o pensamento corrente. Contudo, é bom alertar àquele que detém os recursos sobre a tentação da presunção. Em uma posição de poder e conforto é sabido que o ser humano tende a desvalorizar o novo, o diferente e o desconcertante (Alfa Collab, 2021).

Como efetivamente promover a assimilação da inovação aberta

O temor dos executivos alta liderança de verem as suas empresas ficarem para trás devido ao acelerado processo de obsolescência verificado em segmentos tradicionais, conduz ao ponto que desejamos abordar ao final deste breve ensaio. Sob esta perspectiva, ao menos uma questão paira sobre a cabeça daqueles responsáveis pela comunicação interna: como conduzir os líderes e as suas equipes operacionais à adoção de práticas diárias da inovação?

Não é suficiente que os integrantes de uma organização estejam a par das novas disrupções do mercado. A chave da questão é a mudança comportamental desses indivíduos para que, de modo permanente, estejam atentos às oportunidades de melhorias, às interações com o ecossistema de inovação, à evolução tecnológica e às tendências dos investimentos; além de saberem mais sobre capital de risco, incorporarem atitudes e métodos ágeis, além de manterem a mente aberta ao novo, à diversidade, e às novas lógicas de funcionamento e de criação de valor.

Neste ponto vale recordar a célebre frase de Napoleão Bonaparte: “existem duas alavancas que movem um homem, o medo e o interesse pessoal”. A experiência de líderes empresariais parece indicar de forma quase unânime de que é preciso criar sistemas de incentivos, apelando para o interesse pessoal quando o objetivo é modificar padrões comportamentais. Do contrário, tão somente pelo apelo à importância das transformações, ou pela coerção, a adesão não resulta satisfatória.

Resta saber o que fazer. Seguem algumas recomendações à guisa de conclusão.

  1. O ponto de partida é o estabelecimento de indicadores de desempenho e parâmetros para avaliar progressos, além das metas desejadas. Este é um aspecto que não pode ser menosprezado. Sem métricas bem estabelecidas, capazes de indicar avanços na direção que se deseja (por exemplo, número de startups participantes ou o capital de risco investido), o passo seguinte torna-se inviável;
  2. Deve-se contar com a participação ativa das lideranças do RH e da Comunicação no estabelecimento de um programa de incentivos para a inovação. Em geral, os programas mais bem-sucedidos estabelecem metas tangíveis a serem alcançadas nos planos de ação de cada integrante da organização e não apenas dos líderes;
  3. Em seguida, a comunicação interna é acionada para o desenvolvimento e execução de ações orientadas à sensibilização e à mobilização visando, finalmente, a assimilação das novas práticas desejadas. Esse movimento inclui a criação de um road show para circulação interna, idealmente com a participação do CEO e de Conselheiros, apresentando a importância do programa de inovação aberta e do programa de incentivos para a sobrevivência, crescimento e capacidade competitiva do negócio;
  4. Atenção especial à sensibilização-e-mobilização da média gerência, quase sempre engolfada por suas tarefas diárias, e por isso menos disponível a abraçar novas jornadas. É provável que a conquista de defensores do programa de inovação nesta camada interna represente um ponto de virada para o sucesso da transformação cultural necessária;
  5. Algumas organizações estimulam funcionários a se tornarem eles próprios pequenos investidores de venture capital, tanto na modalidade crowdfunding, como eventuais investidores-anjo, como meio de aquisição de cultura e de mentalidade inovadora;
  6. É também preciso estimular a adoção de práticas próprias da cultura da inovação: são as metodologias ágeis, algumas ferramentas de modelagem, práticas de ideação, co-criação, prototipação, mentorias e outras;
  7. Programas de inovação aberta bem estruturados costumam lançar desafios para o ecossistema como forma de selecionar startups, além de demodays, hackathons e outras atividades características da cultura da inovação. Nessas atividades é muito importante estimular o máximo envolvimento da comunidade interna da empresa;
  8. Por fim, deve-se proporcionar acesso dos funcionários ao ecossistema de inovação de modo a promover o contato com as suas lógicas e ambientes. São comuns as visitas aos hubs físicos, a realização de reuniões de planejamento com executivos-líderes e média gerência em coworkings ou instalações de hubs de inovação, além do contato direto com investidores de venture capital, o acesso a notícias do ecossistema de inovação, tanto nacionais quanto internacionais.

Referências

Alfa Collab (2021). Dentro da Cabeça do Investidor de Risco. Disponível em https://alfacollab.com.br/dentro-da-cabeca-do-investidor-de-venture-capital/.

O’REILLY III, Charles e TUSHMAN, Michael (2004). The Ambidextrous Organization. Cambridge: Harvard Business Review, April 2004.

ROGERS, Everett. (1962). Diffusion of Innovations. The Free Press, New York, NY.

Veja mais

Receba nossos Insights