Claudio Cardoso | Alfa Collab | maio 2021
Bancos serão cada vez mais automáticos. Mas existem outros que serão cada vez mais personalizados.
Até bem pouco tempo a maior parte das pessoas preferia ser atendida por outras pessoas. Esta tendência já pode ter virado de forma definitiva. É fácil notar que hoje preferimos resolver boa parte das tarefas, senão quase todas, por meio de autoatendimento.
Da compra de bilhetes ao mercado semanal, do chamado de um taxi, ou melhor, do chamado de um Uber ao pagamento de contas, preferimos a automação, sem qualquer intermediação humana. Crescentemente, reservamos a interação pessoal para questões mais complexas. Neste caso, ao menos até os dias atuais, elas ainda são necessárias. Mas, em breve, muitos preveem, a hiperautomação – que combina automação robótica de processos (RPA), machine learning (ML) e inteligência artificial (IA) – dará conta de tudo.
O fato é que as máquinas, ao menos na dimensão psicológica, nunca foram percebidas como entidades acolhedoras. Desde a origem, os românticos no final do século XVIII revoltaram-se contra a feiura, o barulho, a sujeira e o automatismo mecânico das máquinas da Revolução Industrial, e suspiravam pela nostalgia dos campos e seus camponeses idílicos. Poucos àquela altura, como o poeta italiano Felippo Marinetti, exaltavam a beleza da velocidade e da máquina.
Em que pese, de um lado, o desconforto no relacionamento com máquinas e, de outro, o bem-estar ao sermos atendidos por pessoas gentis e competentes, os tempos que correm são muito diferentes e hoje queremos um banco na palma da mão. Mesmo interações mais complicadas já são bem resolvidas por pura automação. Embora a experiência em websites de serviços e apps nem sempre sejam satisfatórias.
No entanto, a sabedoria nos ensina que há lugar para todos. Os bancos inteiramente automáticos e cada vez mais inteligentes têm obtido mais destaque nos últimos tempos, especialmente depois do advento das Fintechs e suas soluções ágeis e simplificadas. Mas o bom e velho café com um gerente atencioso tem o seu lugar e função ainda indispensável. Na verdade, entre um e outro, o que muda é a necessidade do cliente.
Bancos automáticos e bancos personalizados
A melhoria dos serviços de autoatendimento já deixou claro que automação não é sinônimo de desumanização. Ao contrário, serviços móveis fáceis de usar, seguros e de alto desempenho, obtém crescente aprovação dos usuários. O autoatendimento perfeito é perseguido por todos os bancos, impulsionados por tecnologias e designs sofisticados, e pela criatividade das Fintechs. Aceleração e intensificação da transformação digital se tornaram palavras de ordem no setor financeiro tradicional.
Bancos-máquina têm seu lugar e vieram para ficar. Sem agências, sem gerentes de carne e osso, sem papeis para assinar, sequer sem cartões de plástico. Tudo pelo celular, fácil, intuitivo, em tempo real. Bancos desta natureza no Brasil já contam com mais de 40 milhões de usuários, um patamar alcançado em um ritmo que dobra a cada ano.
Acontece que, como tudo o mais, bancos deste tipo não são capazes de atender à todas as necessidades. Longe disso. Vamos continuar precisando de serviços financeiros personalizados, com atendimento analítico, contando com a atenção de gerentes e especialistas bem treinados para cuidar de investimentos e outros assuntos relevantes e delicados. O banco personalizado continuará existindo por muito tempo, se é que algum dia desaparecerá.
No fim das contas teremos dois tipos de bancos. Aquele automático, quase um grande computador que calcula e despacha todas as solicitações de forma imediata, via telemática e, um outro, um banco com agências e pessoas acolhedoras, prontas para nos orientar da melhor possível sobre onde aplicar as nossas reservas e encaminhar os nossos investimentos.
Naturalmente, os dois tipos praticarão taxas diferentes. É evidente que bancos super automatizados deverão atender em grande escala a taxas menores, senão inteiramente gratuitas, com os custos operacionais diluídos em suas margens de resultados. Já os bancos personalizados serão obrigados a praticar taxas compatíveis com seus custos operacionais, naturalmente com menor escala. Ao contrário da diferença nas taxas sobre os serviços, ambos os modelos serão igual e intensamente apoiados por tecnologias.
O futuro bate à porta
Os próximos anos serão em grande parte definidos pela forma como a automação vai transformar a vida das pessoas. Serviços inteligentes executarão a maioria das nossas decisões financeiras, muitas delas de forma imperceptível. Este futuro já é, em parte, uma realidade, e deve ser aprimorado até alcançar níveis de excelência em pouco tempo.
Serviços desta natureza, com uso intenso de análise de dados e inteligência artificial, vão cada vez mais interagir e colaborar com os indivíduos para entender os seus objetivos. Por exemplo, entender quando uma pessoa quer se aposentar ou onde seus filhos podem estudar. Uma nova superinteligência emerge e coloca à disposição uma infinita capacidade de oferecer, em microssegundos, praticamente tudo o que o sistema financeiro pode ofertar.
Os clientes desses mega algoritmos podem até não entender como ou por que o serviço inteligente está sugerindo alguns caminhos, mas aos poucos passará a confiar nas orientações automatizadas.
Este cenário pode colocar em xeque o modelo de banco personalizado, mas até certo ponto. Especialistas bem qualificados sempre serão necessários. Tais como os atuais melhores jogadores de xadrez, eles utilizam sistemas sofisticados de inteligência combinados à capacidade humana de análise para fazer a melhor jogada.
O desafio está justamente na articulação de todas as peças, humanas e tecnológicas. E do profundo conhecimento do mundo financeiro, adquirido em décadas de prática – cuidando de grandes fortunas e de pequenas poupanças, ou planejando a vida financeira de clientes em perspectivas de vários anos – apoiados pelo uso intensivo de tecnologias inteligentes. Esse é o futuro dos bancos e dessa combinação nascerão os serviços financeiros vencedores.
Francisco Perez é Diretor de Novo Negócios do Banco Alfa e responsável pelo programa de inovação aberta Alfa Collab.